Rio pode ganhar o primeiro vestibular do estado exclusivo para indígenas e quilombolas

O Estado do Rio pode ganhar um vestibular inédito, voltado exclusivamente para indígenas e quilombolas. A iniciativa é proposta pela Articulação de Políticas Indígenas e Quilombolas (APIQ), que iniciou o projeto em Niterói, na Região Metropolitana, e agora levou o


O Estado do Rio pode ganhar um vestibular inédito, voltado exclusivamente para indígenas e quilombolas. A iniciativa é proposta pela Articulação de Políticas Indígenas e Quilombolas (APIQ), que iniciou o projeto em Niterói, na Região Metropolitana, e agora levou o debate para o âmbito nacional, conquistando apoio de importantes instituições de ensino e até do Ministério da Igualdade Racial.

Segundo Guty Klinsman, coordenadora de comunicação da APIQ e uma das principais articuladoras da proposta, o objetivo é democratizar o acesso ao ensino superior para grupos historicamente negligenciados pelas políticas de inclusão das universidades públicas no Brasil. Hoje, o ingresso nesses cursos ocorre majoritariamente por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

“Essa ausência se deve principalmente à barreira linguística. No Brasil, existem 305 etnias indígenas, e cerca de 275 delas falam línguas diferentes do português. O acesso às universidades públicas, no entanto, é feito integralmente por meio do Enem, em português, o que dificulta a participação de muitos indígenas e quilombolas que não têm o português como língua materna”, explica Guty.

Indígenas correspondem a apenas 0,5% dos universitários

Atualmente, cerca de 46 mil indígenas estão matriculados em cursos superiores no país. Embora o número seja maior do que em 2011, quando havia apenas 9.764, ele ainda representa apenas 3,3% dos mais de 1,4 milhão de pessoas que se identificam como indígenas no Brasil. Em relação ao total de universitários, os indígenas correspondem a apenas 0,5%. Os dados são do Instituto Semesp.

Para a APIQ, o novo vestibular representa uma oportunidade de aumentar essa representatividade. Guty cita exemplos de universidades que já adotaram processos seletivos diferenciados, como a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal de Roraima (UFRR), a Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB).

“Existe uma lei [nº 11.645/2008] que garante aos povos indígenas e quilombolas uma educação diferenciada, baseada em seus conhecimentos tradicionais. O conteúdo que eles aprendem é distinto do ensino convencional das cidades. Por isso, não é justo que façam o Enem com as mesmas provas que os demais estudantes, já que não tiveram a mesma formação. Isso fere um direito previsto em lei e acaba sendo uma forma de segregação”, afirma a ativista.

Como seria o novo vestibular

De acordo com Isabelle Braga, da comissão organizadora do projeto, a proposta prevê que a prova tenha formato diferente do Enem, com questões adaptadas aos saberes e à realidade de cada grupo. A ideia é que o vestibular permita acesso a todas as universidades públicas do estado, incluindo a UFRJ, Uerj, UniRio e a UFF.

Se seguir o modelo pioneiro da UnB, o vestibular poderá ser criado por meio de um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Outra possibilidade seria sua implementação via iniciativa do Ministério da Educação (MEC).

“Não se trata de um vestibular como o Enem, com uma prova universal. É um processo específico, elaborado para atender povos tradicionais, neste caso, indígenas e quilombolas”, reforça Isabelle.

O grupo tem mantido diálogo com universidades, o MEC e os ministérios da Igualdade Racial e dos Povos Indígenas. Em reuniões realizadas em Brasília, representantes do projeto relataram ter recebido apoio, embora a implementação ainda tenha caminhos a percorrer.

Lei de Cotas de 2012

Para o grupo, a Lei de Cotas de 2012, embora fundamental, não tem sido suficiente para garantir maior representatividade desses grupos. A legislação prevê reserva de vagas em universidades e institutos federais para estudantes de baixa renda que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas, incluindo negros, pardos, indígenas e pessoas com deficiência.

“A Lei de Cotas é muito importante, um passo fundamental, um marco de reparação. Mas não é suficiente. Mesmo com avanços, como a maior presença de negros, indígenas e quilombolas nas universidades, ainda somos muito poucos”, destacou Isabelle Braga.

Evento com indígenas e quilombolas em Niterói

Diversas aldeias e comunidades que poderão ser beneficiadas caso a iniciativa seja implementada participaram do 1º Fórum de Educação Superior para Povos Indígenas e Quilombolas do Rio, realizado entre 13 e 15 de agosto na UFF, em Niterói.

O encontro reuniu mais de 300 indígenas e quilombolas do estado e de outras regiões do Brasil. No Rio, marcaram presença aldeias da Costa Verde (Iriri Pataxó, Rio Pequeno, Itaxim e Sapukai), de Maricá (Mata Verde Bonita e Céu Azul) e de contexto urbano, como a Aldeia Maracanã e a Aldeia Vertical.

Diversidade de comunidades quilombolas

Entre os quilombos, a participação foi ampla e diversa. Estiveram presentes comunidades da Costa Verde (Ilha da Marambaia, Santa Rita do Bracuí, Santa Izabel Santa Justina e Campinho da Independência), do Norte Fluminense (Cruzeirinho, Barrinha, Lagoa Feia, ABC, Custodópolis e Machadinha) e da Região dos Lagos (Rasa, Baía Formosa, Maria Joaquina, Maria Romana, Fazenda Espírito Santo e Serra do Mar).

Também participaram quilombos da Região Metropolitana e de Niterói, como Bongaba, Grotão, Cafundá Astrogilda, D. Bilina, Preto Forro, São Jacinto e Maria Conga. O evento contou ainda com representantes da ACQUILERJ, associação que reúne as 55 comunidades quilombolas reconhecidas no estado.





Conteúdo Original

Posts Recentes

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE