Polícia Militar no trânsito: solução ou desvio de função?

Por Filippe Poubel* Com o aumento da criminalidade sobre duas rodas, cresce o debate sobre o papel da Polícia Militar na fiscalização do trânsito urbano. Seria essa a solução mais eficaz ou um uso indevido da força policial? Nos últimos


Por Filippe Poubel*

Com o aumento da criminalidade sobre duas rodas, cresce o debate sobre o papel da Polícia Militar na fiscalização do trânsito urbano. Seria essa a solução mais eficaz ou um uso indevido da força policial?

Nos últimos anos, crimes cometidos por motociclistas, muitos disfarçados de entregadores, tornaram-se rotina nas grandes cidades brasileiras. Furtos, assaltos à mão armada, sequestros-relâmpago e outros delitos são registrados diariamente, em vídeos amadores e reportagens policiais. A imagem do criminoso mascarado por trás de uma mochila de delivery virou símbolo do desafio da segurança pública urbana.

Diante desse cenário, a solução imediata parece lógica: acionar a Polícia. Mas será que a simples presença da PM nas ruas, como agente de trânsito, resolve o problema? Ou estaria a corporação desviando-se de sua função principal — garantir a segurança pública — ao ser usada em tarefas tipicamente administrativas?

A complexidade da fiscalização

A atuação da Polícia Militar na fiscalização de trânsito é prevista no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), mas deve seguir parâmetros legais e administrativos bem definidos. Quando atua nessa função, o policial militar se torna formalmente agente da autoridade de trânsito, podendo orientar, autuar e aplicar medidas como retenção de veículo ou apreensão da CNH.

Contudo, é importante lembrar que a PM não é o único órgão competente. Guardas Municipais, agentes do Detran, das Secretarias Municipais de Mobilidade e a Polícia Rodoviária Federal (PRF) também têm atribuições no controle do tráfego. O artigo 23 do CTB prevê que a fiscalização pode ser exercida por diversos entes, desde que conveniados com o Sistema Nacional de Trânsito.

Função primária da Polícia Militar

É necessário diferenciar infrações administrativas de crimes. Questões como documentação vencida, IPVA atrasado, faróis queimados ou CNH fora da validade são irregularidades que não exigem, a princípio, o envolvimento de forças armadas treinadas para o combate ao crime.

Constitucionalmente, a Polícia Militar é uma força de segurança pública voltada à prevenção e repressão de crimes. Destinar seu efetivo a atividades administrativas reduz sua eficácia no policiamento ostensivo e investigativo, além de comprometer o uso racional dos recursos públicos e humanos.

A urgência da segurança urbana

Por outro lado, muitos delitos urbanos envolvem o uso de veículos — sobretudo motocicletas. Nesse contexto, a presença da PM no trânsito pode sim ter caráter preventivo e estratégico, especialmente na abordagem de veículos suspeitos, recuperação de bens roubados e contenção de práticas perigosas como os chamados “rolezinhos” — aglomerações organizadas por redes sociais que muitas vezes terminam em vandalismo e confrontos.

Para que esse papel seja eficiente, é necessário que a PM atue com inteligência tática e respaldo legal, evitando generalizações ou abusos. O foco deve ser a repressão qualificada ao crime, e não a punição do cidadão comum por pequenas irregularidades.

O uso da Polícia Militar como agente de trânsito precisa ser repensado sob a ótica da eficiência e funcionalidade. O Brasil possui múltiplas instituições legalmente competentes para gerir o trânsito — cabe ao poder público organizar e capacitar esses agentes para assumirem plenamente essa função.

Deixar que a PM atue onde sua presença é indispensável — no enfrentamento da criminalidade — é uma medida de gestão inteligente e um compromisso com a segurança real da população. Afinal, enquanto a PM está parada fiscalizando documentos, o crime continua em movimento.

  • *Filippe Poubel é deputado estadual pelo PL no Rio de Janeiro.



Conteúdo Original

2025-07-30 13:15:00

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