É nefasta a pressão das polícias civis contra a ampliação dos poderes da Polícia Federal (PF) prevista na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública. Representantes das forças policiais criticam a intenção de a PF passar a investigar crimes hoje sob responsabilidade da Polícia Civil. Mas a realidade demonstra que o arranjo atual não tem funcionado. O crime organizado segue crescendo. Sem as mudanças da PEC, a PF continuará com poder limitado de enfrentar milícias e facções criminosas. A ampliação de suas atribuições está apoiada em justificativas sólidas.
- Editorial: Diversificação de atividades do crime organizado é alarmante
Em qualquer lugar do mundo, a impunidade é uma das maiores aliadas do crime organizado. Nesse quesito, o desempenho brasileiro é sofrível. Na Bahia, apenas 15% dos homicídios são esclarecidos pela Polícia Civil. No Piauí, 22%, e no Rio 25%, segundo dados do Instituto Sou da Paz. A taxa de esclarecimento em todo o país, 39%, está muito abaixo da média global, 63%. Violência, homicídios, investigação policial deficiente e crime organizado estão interligados. O medo de perda de poder despertado pela PEC em policiais civis é infundado. Com níveis tão baixos de esclarecimento de homicídios, é evidente que há trabalho para todos.
- Editorial: Crime organizado representa ameaça para a democracia
Eleição após eleição, governadores investem pouco ou nada em equipamentos e treinamento das polícias civis e raramente cobram resultados. A corrupção policial incentiva a vista grossa, e a lentidão do Judiciário beneficia os criminosos. Num cenário em que todos esses problemas tivessem sido resolvidos, a Polícia Civil ainda estaria em desvantagem, pois atua apenas dentro dos limites do estado.
Só a PF tem condição de enfrentar organizações criminosas espalhadas por todo o país e também além das fronteiras. Foram os federais que desvendaram a corrupção de policiais de São Paulo por integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) durante investigação sobre o assassinato de um informante no aeroporto de Guarulhos no ano passado. A PF também tem adquirido capacidade cada vez maior em investigações financeiras, necessárias para asfixiar o crime (nesta semana, deflagrou operação para combater pirâmides e lavagem de dinheiro por meio de criptoativos).
Lideranças do agronegócio também têm criticado a intenção de conceder à PF maiores poderes de investigar infrações penais contra o meio ambiente. Argumentam que polícias militares e Ibama já têm poder de fiscalizar propriedades rurais. Mas a devastação e o desmatamento também vicejam num ambiente de impunidade. Basta lembrar a proliferação de incêndios criminosos que raramente são esclarecidos ou punidos.
Caso o Congresso aprove a ampliação das atribuições da PF, será inescapável aumentar seu quadro de pessoal. Mas, apesar do custo, o país precisa de uma corporação com capacidade técnica e amplo alcance para combater o crime organizado.
2025-05-29 00:09:00