Tudo começou na apuração da invasão de uma delegacia em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, por traficantes, para resgatar um criminoso preso. As investigações conduziram à prisão em flagrante, numa favela da Baixada, de três suspeitos de integrar a organização criminosa Comando Vermelho (CV). Com eles havia um caderno repleto de números de telefones. Foi a semente de um trabalho exaustivo envolvendo quebra de sigilos de comunicação, relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e até o apoio da agência que trata de crimes e ameaças transnacionais nos Estados Unidos. Ao final, estava mapeado um esquema de compra de drogas e armamentos pelo CV. Para tentar ludibriar a polícia e o Coaf, os traficantes fracionavam os pagamentos realizados por meio de Pix. Em seu relatório final, a polícia pede o bloqueio de R$ 40 milhões e o Ministério Público a prisão de 22 denunciados.
Um dos investigados faz parte de um grupo de traficantes de outros estados que foram para o Rio em busca de refúgio e treinamento. Um deles passou meses no Complexo do Alemão, subiu na hierarquia da facção criminosa e é dono de um fuzil capaz de abater helicóptero. Continua foragido, mas foi por meio do rastreamento dele que a polícia chegou ao dono de uma loja de armas em São Paulo, registrado como colecionador, atirador desportivo e caçador (CAC), com acesso legal a armas e munições. A análise de dados do Coaf revelou que, também presidente de um clube de tiro, usava suas empresas para abastecer traficantes. Há registro do recebimento de R$ 1,6 milhão pela venda de carregadores e munição. Outro dos presos, acusado de transferir dinheiro em troca das armas, comprou um imóvel na Barra da Tijuca por R$ 9 milhões e, seis meses depois, repassou a um filho por R$ 500 mil, negócio que, segundo a polícia, caracteriza lavagem de dinheiro.
“Toda operação é lícita até um determinado momento em que entra na ilegalidade”, diz o delegado Carlos Oliveira, subsecretário de Planejamento e Integração Operacional. A investigação mostra como, para combater o crime organizado, se tornou fundamental esmiuçar esse “mercado cinza”. As informações e conexões desbaratadas pela polícia por meio do uso da inteligência se revelam muito mais eficazes que as operações violentas, em geral realizadas sem nenhum planejamento.
2025-05-15 00:09:00