Parece que não terá fim. Realmente parece que os confrontos no Morro dos Macacos não terão um término. Deteriorando-se em alta velocidade, o importantíssimo bairro de Vila Isabel dá sinais de que vai sucumbir a qualquer instante. Comércios são fechados diariamente; placas de “aluga-se” e “vende-se” se multiplicam; valores são cada vez menores; os bares, outrora lotados, ou andam às moscas ou contam com bem menos movimento; e as escolas cerram as portas por precaução. Em dezembro de 2024, a Escola de Samba Vila Isabel teve que cancelar ensaio. Nada, absolutamente nenhuma ação governamental parece surtir efeito. No meio, moradores, que pagam alto a conta. Até quando?
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Já que estamos falando da Vila…
No começo do Boulevard Vinte e Oito de Setembro há uma emblemática estátua de Noel Rosa sendo servido por um garçom. O poeta está sentado na cadeira, e sobre a mesa se encontram uma garrafa de cerveja, um maço de cigarros e, entre outros objetos, dois copos. Ao seu lado, uma cadeira vazia convida os passantes a entrar na cena — referência direta a um dos clássicos de Noel, “Conversa de botequim”.
Filho famoso da Vila e morador da Teodoro da Silva, Noel chegou ao mundo com uma marca que o acompanharia para sempre: uma fratura na mandíbula causada por um parto malfeito com fórceps. Essa característica virou munição para desafetos, como o também compositor Wilson Batista, que o apelidou de “Frankenstein da Vila”. A rivalidade dos dois se transformou em músicas e mais músicas, inclusive valorizando as características boêmias de Vila Isabel.
Ícone mais recente das noitadas sem fim, o Petisco da Vila faz uma falta imensa. Fundado em 1947 pelo Manelzinho, o bar se tornou um verdadeiro ponto de encontro de pessoas interessantes. Luiz Carlos da Vila, Aldir Blanc e Martinho das Vila eram alguns dos que batiam ponto naquele que já foi considerado o reduto que mais vendia chope em todo o país. Uma prática criada — ou popularizada — pela turma do Petisco inspirou Antônio Rodrigues, no Belmonte: garçons passarem nas mesas com bandejas repletas de salgados. É sempre complicado recusar.
Todo dia 17 de janeiro acontecia o famoso 171, com entrega de diplomas bem-humorados para os “pilantras honorários” da Vila. Tudo sob a batuta da gloriosa União da Pilantragem de Vila Isabel. Infelizmente essa maravilha fechou as portas em 2017. Uma das causas? Insegurança.
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Já que andam me pedindo indicações de bares, sugiro, em Vila Isabel, o “Bar Gato de Botas” (a variedade de aperitivos enlouquece qualquer um) e “Buteco Ovo Frito” (o atendimento sempre é bom).
O dono do Morro dos Macacos
Muito antes de as primeiras famílias chegarem ao morro, ali ficava a Fazenda dos Macacos — é daí que vem o nome. O dono, um pouco depois da metade do século XIX, era João Batista Viana Drummond, o barão que criou o zoológico, viu a grana secar após chegar a República, inventou o jogo do bicho para tentar salvar o negócio e foi essencial para que Vila Isabel tivesse a estrutura que conhecemos.
Recentemente, a repórter Laís Vieira, da CBN, denunciou que grades do antigo zoológico estão sendo furtadas. Em 2019, O GLOBO já noticiava que a estátua de Noel Rosa fora depredada duas vezes em menos de uma semana. A mesa e o garçom foram levados embora. Até quando?
2025-05-16 04:30:00