Investigação mostra que Comando Vermelho tem no Complexo da Penha até um ‘especialista em propinas’

A investigação da Delegacia de Repressão aos Entorpecentes (DRE) da Polícia Civil, que embasou a denúncia do Ministério Público e a megaoperação desta semana, com 121 mortos, revelou como o Comando Vermelho montou uma estrutura complexa para tocar suas ações


A investigação da Delegacia de Repressão aos Entorpecentes (DRE) da Polícia Civil, que embasou a denúncia do Ministério Público e a megaoperação desta semana, com 121 mortos, revelou como o Comando Vermelho montou uma estrutura complexa para tocar suas ações criminosas. Mensagens interceptadas pelos agentes demonstram a hierarquia estabelecida pelos traficantes, que se dividem em funções como general de guerra, juiz do tribunal do tráfico e até um especialista em pagamento de propina a policiais.

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Juan Breno Malta Ramos Rodrigues, o BMW — Foto: Reprodução

O chefe do Comando Vermelho nos complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte do Rio, é Edgar Alves de Andrade, o Doca. Abaixo dele, um grupo de traficantes divide tarefas de administração das atividades criminosas na região e em outras favelas do Rio.

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Um deles é Carlos Costa Neves, o Gadernal: um dos alvos da operação, ele, que conseguiu fugir do cerco policial, é o “general” do CV e chefe de segurança de Doca. Segundo a investigação, o bandido é responsável ainda por definir estratégias nos confrontos contra quadrilhas rivais e nas táticas de enfrentamento a policiais, como o monitoramento de movimentação das tropas. Em diversas situações, são usadas estratégias militares de camuflagem na mata e armas de guerra, como fuzis de alto calibre, capazes de derrubar helicópteros.

A investigação da DRE também descreve episódios de tortura praticados pelos integrantes do CV para punir comparsas e moradores. A figura responsável por orientar as punições e participar dos chamados “tribunais do tráfico”, com autonomia para determinar até a execução de rivais de menor expressão, conforme consta no relatório, é um dos chefes do grupo paramilitar: Juan Breno Malta Ramos Rodrigues, o BMW.

Castigo.  Mulher é mergulhada  em banheira cheia de gelo por ter brigado em um baile funk: ordem teria partido  de BMW — Foto: Reprodução
Castigo. Mulher é mergulhada em banheira cheia de gelo por ter brigado em um baile funk: ordem teria partido de BMW — Foto: Reprodução

Suspeito de comandar o grupo que matou médicos por engano na Barra da Tijuca, em 2023, ele é acusado de ser chefe do grupo de matadores Equipe Sombra e de promover treinos de tiro com fuzis na Mata da Misericórdia, onde aconteceram os principais confrontos dessa semana. Juan Breno também oprime moradores. A denúncia narra o caso em que uma mulher aparece mergulhada numa banheira de gelo, só com a cabeça de fora. A ordem do castigo teria partido de BMW, porque a vítima teria brigado durante um baile funk.

Em outro episódio, um homem amordaçado e algemado é arrastado por um carro, vestindo short, sem camisa. “Em meio a gritos implorando por perdão”, o alvo da punição cita BMW diversas vezes, enquanto o denunciado “faz piada do sofrimento alheio, debochando da vítima agonizante”, diz o MP.

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Outro integrante desse grupo é Fagner Campos Marinho, o Bafo, espécie de carrasco do tribunal do tráfico. A denúncia conta um episódio em que ele teria torturado um homem e gravado parte da ação. A vítima aparece amarrada, ensanguentada e gemendo de dor. Bafo se gaba de ter “dado a massagem” e pergunta se o homem queria “morrer logo”.

A investigação ainda revela a relação entre traficantes e policiais. Washington César Braga da Silva, conhecido como Grandão e apelidado de “síndico da Penha”, foi apontado nas investigações como o criminoso encarregado de negociar com policiais militares das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) o pagamento do chamado “arrego”, para reduzir a fiscalização e a repressão ao tráfico de drogas.

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De acordo com o inquérito, Grandão, além de pagar propina a policiais das UPPs, coordenava os soldados do tráfico nas ruas e era o responsável por montar as escalas de plantão. Ele também administrava eventos da Penha, como os bailes funk. Segundo investigadores, Grandão mantinha até um telefone exclusivo para se comunicar com PMs. Em uma conversa do traficante interceptada pela DRE, um policial militar pede ajuda para recuperar um carro roubado em 26 de abril do ano passado — e recuperado três dias depois.

A investigação também colheu anotações que mostram a contabilidade do tráfico: em uma imagem obtida a partir da quebra do sigilo telefônico de um homem apontado como gerente do tráfico do Alemão, há uma lista de gastos que soma R$ 39 mil. O “arrego” aparece como o segundo item da relação, com valor de R$ 4,5 mil.

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Ainda foi identificado m terceiro escalão formado por gerentes de pontos de venda de drogas e responsáveis por áreas subordinadas a Doca. Segundo os investigadores, grupos de WhatsApp eram utilizados para coordenar torturas e até execuções.



Conteúdo Original

2025-10-31 04:30:00

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