Esquema milionário de resgate de carros roubados liga PMs, empresas e traficantes, diz polícia

A Polícia Civil do Rio deflagrou nesta sexta-feira (23) a primeira fase da Operação Torniquete, que desmantela um esquema milionário de resgate de carros roubados envolvendo empresas privadas, traficantes e, segundo as investigações, até agentes públicos. Três policiais militares são


A Polícia Civil do Rio deflagrou nesta sexta-feira (23) a primeira fase da Operação Torniquete, que desmantela um esquema milionário de resgate de carros roubados envolvendo empresas privadas, traficantes e, segundo as investigações, até agentes públicos. Três policiais militares são suspeitos de participação ativa nas negociações com criminosos.

As empresas, contratadas por cooperativas de proteção veicular e conhecidas como “pronta resposta” ou “pronto emprego”, negociavam diretamente com traficantes e receptadores para recuperar veículos roubados — principalmente em áreas dominadas por facções como o Comando Vermelho (CV) e o Terceiro Comando Puro (TCP). Em 11 meses, quatro dessas empresas receberam mais de R$ 11 milhões de apenas duas associações, em troca da devolução de mais de 1.600 veículos.

A operação também revelou que o índice de recuperação de veículos por essas empresas chegou a 80% em fevereiro de 2025, um número que chamou a atenção da polícia e contribuiu para a abertura da investigação.

Durante a coletiva, o secretário de Segurança Pública do Rio, Victor César dos Santos, destacou a natureza inédita da operação:

— Essa é uma operação e uma investigação inéditas. Nunca houve uma ação desse porte envolvendo o roubo de veículos nesse contexto. As cooperativas contratavam essas empresas, que faziam contato direto com os traficantes e pagavam, em média, 10% do valor do carro na tabela Fipe — afirmou.

Segundo ele, o tráfico lucrava com os pagamentos, e o cidadão, acreditando estar protegido, na verdade era vítima de uma indústria criminosa.

— O cliente, sem saber, é vítima do próprio serviço que contratou — ressaltou Victor César.

O que são empresas de “pronta resposta” ?

As empresas de “pronta resposta” são contratadas por cooperativas e associações de proteção veicular para atuar na tentativa de localizar e recuperar carros roubados ou furtados. Na prática, elas funcionam como uma espécie de “segurança privada” para os veículos protegidos. Diferentemente de seguradoras tradicionais, que pagam indenizações com base na tabela Fipe, essas empresas têm como prioridade recuperar o bem para evitar o pagamento.

Como funcionava o esquema de “resgate”?

Em vez de seguir caminhos legais, as empresas de pronta resposta negociavam diretamente com criminosos para que os veículos roubados fossem devolvidos. Esse contato, segundo a polícia, acontecia dentro de comunidades dominadas por facções criminosas, e envolvia pagamentos que variavam, em média, entre R$ 6 mil e R$ 10 mil por carro — o equivalente à cerca de 10% do valor do veículo na tabela Fipe. No caso das motos, os valores pagos às facções podiam chegar a 20% ou até 30% do valor de mercado, segundo a polícia.

Para os criminosos, o “resgate” virou uma fonte rápida e segura de lucro. Para as empresas, é mais barato pagar o resgate do que arcar com o valor total do carro. Para o cliente, porém, a situação é enganosa: ele acredita estar protegido, mas na prática apenas contribui para um sistema ilegal que incentiva ainda mais roubos. O alto índice de recuperação em tempo recorde (média de quatro dias), de acordo com a polícia, reforça a suspeita de conivência direta com quem comete os crimes.

Para o secretário, a atividade ilegal se consolidou como uma importante fonte de renda para o crime organizado.

— Essas quadrilhas contam com especialistas em roubos e com o poder de fogo que o tráfico oferece — completou.

Para a polícia, o esquema contribuiu diretamente para o aumento expressivo nos índices de roubo de veículos na capital e na Baixada Fluminense nos últimos meses. O delegado André Neves, do Departamento Geral de Polícia Especializada (DGPE), deixou um recado direto:

— Fica o alerta para quem insiste em se beneficiar desse sistema e para os agentes públicos envolvidos. A Polícia Civil está em cima, e a resposta será à altura. Temos, sim, agentes duplos: três policiais militares estão sob investigação.

Mandados continuam sendo cumpridos

Segundo a Delegacia de Roubos e Furtos de Automóveis (DRFA), os mandados de busca e apreensão desta sexta-feira foram cumpridos principalmente em imóveis de alto padrão no Recreio dos Bandeirantes, na Zona Oeste do Rio, e na Baixada Fluminense. A polícia afirma, no entanto, que novas diligências devem ocorrer, já que esta é somente a primeira fase da operação.

A ação teve como objetivo apreender celulares, computadores e documentos que possam comprovar a participação das empresas nas negociações com os criminosos, além de identificar os interlocutores do lado do tráfico.

Mauro César, titular da DRFA, destacou que março foi o melhor mês da série histórica, desde 1992, na redução dos roubos de veículos, e reforçou que a operação continua.

— Só essas quatro empresas foram responsáveis pela recuperação de mais de 1.600 veículos. Nos mandados, já apreendemos até uma Mercedes. E vamos continuar — afirmou Mauro César.

A Operação Torniquete busca desarticular esquemas criminosos que financiam o tráfico no Rio. Desde setembro de 2024, a ofensiva já prendeu mais de 520 pessoas e recuperou veículos e cargas avaliados em R$ 37 milhões. Além disso, R$ 70 milhões em bens e valores foram bloqueados.



Conteúdo Original

2025-05-23 12:00:00

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