Eweline Passos Rodrigues, de 28 anos, conhecida como Diaba Loira, tinha perfis no TikTok que marcam dois momentos distintos de sua vida. O mais reservado deles tem só dois vídeos, nos quais ela aparece com um ex-marido e dois filhos pequenos. O homem, inclusive, chegou a ser réu por tentativa de feminicídio contra ela, mas foi absolvido pelo júri em Santa Catarina, onde moravam. Nos outros perfis — há um de quase 70 mil seguidores —, ela compartilhou fotos e gravações sobre a rotina no tráfico de drogas no Rio de Janeiro, estado onde foi morta na última quinta-feira em contexto investigado pela Delegacia de Homicídios da Capital.
O primeiro perfil começa com uma publicação de 2020. Um vídeo de 14 segundos protagonizado pela primogênita, à época bebê, e o ex-marido. Os dois aparecem numa praia jogando bola. O outro registro, de 2021, segue uma “trend” — uma daquelas brincadeiras virais das redes — em que ela aparece junto ao companheiro, um homem negro, à filha e ao caçula. Eweline está de short, blusa rosa, cabelos soltos e maquiada, bem diferente da Diaba Loira que alimenta os outros perfis.
O de 70 mil seguidores, inclusive, parece ser recente. A primeira publicação é de 8 de julho deste ano: uma foto de Eweline com roupa camuflada, semelhante às usadas por agentes de segurança pública, e uma arma “escondida” por emojis de fogo e urso. Na legenda, ela escreveu: “terror do urso”, e marcou a hashtag “penha”. As menções fazem alusão ao chefe do tráfico nessa comunidade, o Edgar Alves de Andrade, o Doca ou Urso, representante do Comando Vermelho, facção em que Diaba foi associada no passado, segundo a polícia. Atualmente, ela estaria ligada ao Terceiro Comando Puro.
No perfil, há ainda outras seis publicações dela com a mesma vestimenta, assim como 14 em que ela está fazendo sinal referente ao TCP. Diferentemente das postagens de 2020, ela aparece agora com tatuagens pelo corpo, como na região do pescoço, onde há uma montagem da risada do personagem Coringa, da DC Comics, com as máscaras da tragédia e da comédia, conhecidas na área do teatro. Nas costas, há uma ilustração de cobertura extensa, na qual Eweline aparece de frente para o Morro do 18, na Zona Norte, segurando um fuzil e fazendo o número três com a mão esquerda (sigla do TCP). No desenho, aparecem também um coelho e um jacaré, referência aos chefes da facção William Yvens Silva, o Coelhão da Serrinha, e o Wallace de Brito Trindade, o Lacoste da Serrinha.
Em outro perfil, também criado em julho, Eweline seguia esse mesmo padrão, compartilhando a vida com cerca de 30 mil seguidores. Em uma publicação, ela respondeu a uma provocação sobre ter trocado de facção e traído o Luiz Cláudio Machado, o Marreta, nome forte no Comando Vermelho e, atualmente, preso em penitenciária federal.
“A única coisa que eu aprendi lá (com o CV) foi que eles (os traficantes do CV) eram uma cambada de mesquinhos, de egoístas. Só pensavam neles mesmos, não estavam nem aí para morador, iam em comércio, pegavam um monte de coisa e não pagavam. O Marreta não me deu nada. Eu apanhei lá, fui esculachada, porque falei que um cara tava roubando”, disse.
Em outra, em que era ameaçada em anônimo por representantes do CV, ela respondeu: “Eu sei que vocês são uns despreparados, uma cambada de peidão. Vocês tão me dando ibope”.
Antes de se associar ao tráfico, Eweline trabalhou como cobradora interna e alfaiate, com salários que variavam entre R$ 1.017 e R$ 1.346. No nome dela, há uma empresa voltada para promoção de vendas, registrada em Tubarão, sua cidade natal, em Santa Catarina, com capital social de R$ 3 mil.
Segundo a Polícia Civil catarinense, a tentativa de feminicídio sofrida em 2022, em Capivari de Baixo, cidade vizinha a Tubarão. Ela foi atacada com uma facada no pulmão pelo ex-companheiro e passou por uma cirurgia de emergência.
— A primeira vez que me deparei com a Eweline foi quando ela foi vítima de uma tentativa de feminicídio. O sujeito e a família alegavam que ela havia se apossado de uma quantia em dinheiro dele — contou o delegado André Luiz Bermudez Pereira, da 5ª DRP, em Tubarão.
O ex-marido trabalhava em outro estado e relatou em depoimento que, ao voltar a Santa Catarina, descobriu que Eweline o traía e se apropriava do dinheiro que ele a enviava para ser guardado. Ele foi absolvido em júri.
Prisões antes do assassinato no RJ
Em maio de 2023, Eweline foi presa em flagrante pela Polícia Militar de Santa Catarina ao transportar sete gramas de cocaína. Ela teve permissão para ser investigada em liberdade, mas com uso de tornozeleira eletrônica. No entanto, acabou violando a medida.
Já em janeiro de 2024, ela e um comparsa foram presos por porte ilegal de arma de fogo e tráfico de drogas. Policiais receberam a informação de que eles iriam executar um rival:
— A sequência dos elementos deixava claro que ela fazia parte de uma facção catarinense e atuava também em Florianópolis — afirmou Pereira.
Eveline também conseguiu liberdade enquanto o caso era investigado. Violou novamente a tornozeleira eletrônica imposta e fugiu para o Rio de Janeiro, onde se filiou, primeiro, ao Comando Vermelho, depois, ao Terceiro Comando Puro.
2025-08-16 08:34:00