Cruciais para acordo, rotas do tráfico podem alavancar conflitos após fim da trégua entre CV e PCC

De ambos os lados, interesses econômicos impulsionaram o cessar das mortes costurado no início do ano. Para o PCC, já estabelecido como um dos maiores atores do tráfico internacional de cocaína, a disputa por territórios e os custos com a


De ambos os lados, interesses econômicos impulsionaram o cessar das mortes costurado no início do ano. Para o PCC, já estabelecido como um dos maiores atores do tráfico internacional de cocaína, a disputa por territórios e os custos com a guerra já eram encarados como algo a ser superado. Já os chefes cariocas do CV, que ainda têm atuação embrionária nas remessas de drogas para fora do país, viram na nova aliança uma oportunidade de alavancar seus negócios.

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— Essas organizações estão se tornando máfias. Não mais voltadas a um tipo ou dois de crimes, mas para o crime nas mais variadas vertentes, que lava dinheiro fazendo negócios com o poder público, com a sociedade civil e a política. Para a máfia, o movimento de guerra até acontece periodicamente, mas é melhor a paz — diz Mário Sarrubbo, secretário nacional de Segurança Pública, do Ministério da Justiça.

No curto período em que a aliança vigorou, a trégua pegou em alguns estados. Em Mato Grosso do Sul, cruzado pela Rota Caipira, forças de segurança voltaram a apreender remessas de droga enviadas em consórcio pelas facções nas rodovias do estado — que, por quase uma década, foram monopolizadas pelo PCC.

No Rio, dezenas de integrantes do PCC, que há quase uma década cumpriram suas penas no sistema penitenciário fluminense em unidades dominadas pelo Terceiro Comando Puro (TCP) — facção rival ao CV com quem os paulistas mantiveram relações no período da guerra — , pediram para serem transferidos para cadeias que abrigavam os recém-aliados. Um deles foi Luciano Iatauro, apontado pela Polícia Federal (PF) como homem forte da quadrilha paulista no Rio, responsável por mediar a logística de fornecimento de drogas e armas do PCC para os parceiros locais.

À direção da Penitenciária Jonas Lopes de Carvalho (Bangu 4), Iatauro afirmou que temia “por sua integridade física e moral” e que não podia mais ficar na unidade por “incompatibilidade com outros internos”. Dois dias depois, ele e outros 14 integrantes da organização de São Paulo foram realocados no Gabriel Ferreira Castilho (Bangu 3), morada carcerária dos integrantes mais relevantes da hierarquia do CV presos no Rio.

Luciano Iatauro mudou de cadeia — Foto: Reprodução

Segundo policiais que investigam o tráfico no Rio, o contexto atual da facção carioca ajuda a explicar o motivo da proposição da trégua aos paulistas. Historicamente voltado para dominação de territórios e para o tráfico doméstico, o CV ainda engatinha na exportação de cargas de maconha e cocaína — ao contrário do PCC, que ao longo das últimas décadas passou a controlar toda a cadeia logística do tráfico transnacional. Investigações recentes da PF, no entanto, mostram o interesse da cúpula do CV em estender seus tentáculos para o mercado exterior.

Até meados da década passada, a facção se associava a “matutos” que traziam cocaína da Colômbia e da Bolívia e participava só da armazenagem da droga, que ficava no Complexo da Penha até ser colocada em navios de carga no Porto do Rio. Os donos do entorpecente pagavam, assim, somente pelo serviço logístico. Mais recentemente, o CV se impôs e avançou sobre uma fatia maior: passou a cobrar dos sócios 10% sobre o faturamento com a venda das drogas na Europa.

Em 2023, a investigação que culminou na deflagração da Operação Novos Rumos revelou que a cúpula da quadrilha decidiu deixar de atuar apenas como intermediário, passando a enviar cargas próprias à Europa, sem dividir os lucros da operação. No Rio, a facção chegou a contratar mergulhadores para ocultar pequenas quantidades de droga em cascos de navios no porto. Em janeiro passado, uma carga de cocaína de um chefão do CV do Rio saiu do Brasil em um contêiner por um porto do Nordeste rumo à Europa.

Diante dos novos movimentos, a chance de se associar aos paulistas e ter acesso a seus fornecedores, compradores e entrepostos logísticos foi um dos motores para a tentativa de trégua. Com a costura naufragando, e em meio à investida do CV em um mercado com forte presença do PCC, o cenário se torna ainda mais incerto.



Conteúdo Original

2025-05-04 03:30:00

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