De janeiro a agosto, o programa Cliente Misterioso, do Instituto Combustível Legal, recolheu 2.229 amostras de combustível em 13 estados. O resultado da análise, revelou reportagem do Jornal Nacional, foi assombroso: 34% da gasolina estava fora do padrão, assim como 15% do diesel e do etanol. Sem contar a adulteração de bombas para cobrar mais que o combustível colocado no tanque. As duas fraudes podem ocorrer ao mesmo tempo: vende-se combustível adulterado e cobra-se a mais. O cliente paga por algo que não recebe e ainda é forçado a gastar mais na manutenção do veículo que roda com o combustível adulterado.
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A Agência Nacional do Petróleo (ANP) minimiza o problema. Argumenta que “apenas” 3% dos combustíveis estão fora de “conformidade”. Pode ser. Mesmo assim, 3% não é pouco. Ainda mais se as adulterações estiverem concentradas em algumas regiões. O Instituto Combustível Legal verificou mais problemas nos estados de São Paulo, Rio, Minas, Paraná, Mato Grosso e Bahia.
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A dificuldade não se resume à competição desleal com os donos de postos ou redes que seguem a lei. É crescente e preocupante, sobretudo, o envolvimento do crime organizado no setor. O Primeiro Comando da Capital (PCC) escolheu o ramo de combustíveis para lavar dinheiro do tráfico e aumentar seus lucros, em boa medida atraído pela facilidade para praticar fraudes.
A dimensão de como a atividade está tomada pela facção criminosa ficou evidente com a operação contra o PCC deflagrada no mês passado em vários estados. A rede de postos comandada pelos criminosos foi estimada em mais de mil estabelecimentos, tendo movimentado pouco mais de R$ 50 bilhões entre 2020 e 2024. Na região de Ribeirão Preto (SP), um dos maiores polos nacionais de produção de álcool e açúcar, seis usinas foram vinculadas a integrantes do PCC. Com isso, a facção criminosa passou a atuar em toda a cadeia do etanol, do campo ao posto.
Não faltam evidências de que a maior parte das fraudes está associada ao crime organizado. Em junho, fiscais da ANP surpreenderam um caminhão despejando metanol num tanque de etanol de um posto em São Paulo. Para enganar a fiscalização, um tubo na boca do tanque era usado para fornecer amostras falsas. O posto já era investigado como parte da rede de abastecimento do PCC.
As amostras adulteradas desmascaradas pelo Instituto Combustível Legal expõem a inépcia do Estado para enfrentar o crime organizado com eficácia, de forma preventiva. O próprio Estado perde em arrecadação de impostos. E o cidadão é punido de diversas formas. Paga mais caro por um produto de baixa qualidade, que prejudica os veículos e polui mais, além de ajudar a financiar a maior facção criminosa do país.
2025-09-22 00:09:00