O que parecia a solução fácil se torna um pesadelo, e o novelo vai embolando — nós e mais nós aparecem na trama. Enquanto a mansão em reformas vira cenário (belíssimo e verdadeiro personagem do roteiro) de um “Um Dia a Casa Cai” das trevas, com vazamentos, manchas visíveis (e invisíveis) na parede e outros pesadelos afins, a mãe de Regina, Irene Ravache, também genial, tira as cartas para Regina (daí a carta d”O Enforcado’) e elas revelam que uma grande oportunidade vai surgir. Detalhe: ela é mãe de Regina, uma figura materna nada acolhedora, mas narcisista e também manipuladora.
“A mãe dela a manipula. Eu acho que a mãe a criou para ser a poupança dela, para ser a aposentadoria dela. Então, a relação não tem nenhum afeto. Ela não abraça a filha”, comenta Leandra Leal em conversa com Splash. Mais que isso, a mãe criou Regina na Zona Sul do Rio sob preconceitos, hipocrisia e moral duvidosa. Diz absurdos como quem comenta sobre o trânsito, o clima ou qualquer outro assunto trivial e revela com sua atitude que Regina tem de quem herdar suas neuroses, preconceito e também insegurança. Calculista, ela traz essa bagagem para a relação com Valério e vai também manipular, envenenar o marido e reproduzir a lógica da esperteza, de levar vantagem e de fazer vista grossa para sua piscina cheia de ratos.

O que ela (a mãe de Regina) fala é tão louco e tão absurdo que não tem como ser. Esse filme tem situações que poderiam ser reais, mas ele flerta com o absurdo e, por isso, é cômico. Assim, as pessoas hoje falaram muito da comparação “O Lobo” e “Os Enforcados”, e eu acho que “O Lobo” tinha esse lugar mais cruel, de ser mais real, assim, sabe?
Leandra Leal
No entanto, e na verdade, ainda que uma espécie de thriller tragicômico, a situação de “Os Enforcados” também tem muito da realidade brasileira . “É porque é meio absurdo mesmo que a gente vive.” A trama construída por Coimbra, observador contundente da natureza humana, tem ares de crônica de costumes, pois observa de dentro, da cozinha, da sala, do quarto, os jogos de poder da elite brasileira que defende da porta para fora, ou oficialmente, a família, a propriedade, a honra, mas que debaixo do pano, nos jantares, jogatinas e nos becos, é hipócrita, violenta, preconceituosa, gananciosa. Nesta tragicomédia de humor muito sarcástico, todo mundo ganha, mas, essencialmente todo mundo perde.
2025-08-16 13:15:00