Indústria projeta desaceleração neste ano, e tarifaço é 'pedra no caminho'

Puxada pelo desempenho mais fraco da indústria de transformação, a indústria brasileira deve crescer 1,7% em 2025, um ritmo menor que o do ano passado. A projeção é da Confederação Nacional da Indústria (CNI). PIB: indústria sobe 0,5% no 2º




Puxada pelo desempenho mais fraco da indústria de transformação, a indústria brasileira deve crescer 1,7% em 2025, um ritmo menor que o do ano passado. A projeção é da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
PIB: indústria sobe 0,5% no 2º trimestre
A combinação de juros elevados, avanço das importações e a expectativa de queda nas exportações — impactadas pela sobretaxa de 50% aplicada pelos Estados Unidos a produtos brasileiros — tende a limitar a atividade do setor, segundo a CNI.
🔎A indústria de transformação é um setor que realiza a transformação de matéria-prima (insumos) em produtos finais, ou em um item intermediário (que pode ser novamente modificado em outra etapa da produção).
Segundo Mário Sérgio Telles, diretor de Economia da CNI, a indústria brasileira, especialmente a de transformação, tem “andado de lado” nos últimos meses. A estagnação ocorre apesar do aumento na demanda.
“O mercado interno está crescendo, principalmente pelo efeito do aumento de renda do mercado de trabalho, ainda bem aquecido, mas esse aumento de demanda nos últimos meses tem praticamente ou quase que totalmente sendo atendido pelas importações”, avalia o especialista.
CNI identifica que aumento na demanda do mercado interno vem sendo suprida por importações.
Agência de Notícias da Indústria via BBC
Secretário do Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Uallace Moreira ainda assim considera o crescimento industrial deste ano positivo.
“A indústria ainda tem uma continuidade de crescimento, embora você tenha tido esse cenário conjuntural de juros alto e, ao mesmo tempo, dos Estados Unidos desfavoráveis”, reflete.
“Eu ainda acho que esse ano cresce (a indústria) num acumulado, vai crescer 1,8 [%], 1,5 [%], com um PIB (Produto Interno Bruto) aí crescendo 2,5 [%] mais ou menos apesar do tarifário e dos juros alto. Porque a taxa de juros alta, ela inviabiliza o setor de bens de consumos duráveis e, ao mesmo tempo, o setor de investimento, de máquinas e equipamentos”, complementa.
Na análise de Telles, setores mais diretamente ligados ao crescimento da renda e menos sensíveis às variações na taxa de juros têm conseguido absorver melhor essa demanda. Um dos destaques é o setor de alimentos, que vem registrando desempenho positivo dentro do contexto industrial.
Pessimismo na indústria
O empresariado tem demonstrado um crescente pessimismo diante do cenário econômico atual, segundo a Sondagem da Indústria de Transformação, publicação mensal do FGV IBRE (Instituto Brasileiro de Economia). O levantamento apontou que o Índice de Confiança da Indústria (ICI) registrou queda de 4,4 pontos em agosto — a maior retração desde o período da pandemia.
De acordo com Stéfano Pacini, economista da FGV IBRE, o pessimismo captado na pesquisa está fortemente ligado aos desafios de curto prazo enfrentados pelo setor industrial.
“O principal fator macroeconômico que afeta a indústria hoje é, principalmente, a taxa de juros”, explica Pacini.
Segundo o economista, a atual política monetária restritiva tem um efeito direto na atividade econômica, pois encarece e restringe o acesso ao crédito — elemento essencial para o consumo de bens duráveis e para os investimentos produtivos.
“Do ponto de vista do empresário, uma taxa de juros elevada leva à cautela. Ele pensa duas vezes antes de investir, adquirir novos equipamentos ou expandir sua capacidade produtiva”, avalia.
Miriam Leitão: Trajetória da inflação impacta nos juros
Pacini destaca, ainda, que a manutenção dos juros em patamar elevado, apesar de seus efeitos negativos no curto prazo, tem como objetivo controlar a inflação e estabilizar a moeda.
“É uma medida necessária neste momento. A política monetária precisa ser mais rígida para evitar novas pressões inflacionárias, e isso passa por uma desaceleração da atividade econômica”, completa.
Essa leitura é compartilhada por Rafael Cagnin, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).
“A indústria vive um quadro de desaceleração, motivado, em grande parte, por fatores internos. O setor é um importante produtor de bens duráveis — tanto para consumo quanto para investimento —, e depende fortemente do crédito para girar. O aumento da taxa de juros desde o último trimestre do ano passado vem retirando dinamismo do setor”, afirma Cagnin.
Tarifaço
A alíquota de 50% à compra de produtos brasileiros aos Estados Unidos, em vigor desde o dia 6 de agosto, representa “mais uma pedra no caminho do setor”, diz Cagnin.
Em julho, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou uma tarifa extra de 40%, que somada à alíquota já existente, elevou a taxação total para 50%.
Tarifas de Trump têm levado à escalada de guerra comercial global.
Getty Images via BBC
O governo de Trump justificou a medida por razões políticas, mas divulgou posteriormente uma lista de exceções que incluiu, por exemplo, aeronaves – setor sensível para os EUA, cuja frota área utiliza em grande escala modelos da Embraer.
Em paralelo à tentativa de negociação para reversão das tarifas, o governo federal anunciou algumas medidas, como a criação de uma linha de crédito de R$ 30 bilhões para auxiliar empresas impactadas pelo tarifaço.
Infográfico – Plano de socorro do governo a empresas afetadas pelo tarifaço de Trump.
Arte/g1
O Banco Nacional Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) também anunciou uma linha adicional de crédito de R$ 10 bilhões voltada para empresas brasileiras afetadas por tarifas menores que 50% aplicadas pelos Estados Unidos.
Segundo o secretário Uallace Moreira, do Mdic, o Plano Brasil Soberano buscou atender o máximo possível das demandas do setor privado. O pacote é resultado de 39 reuniões conduzidas pelo vice-presidente e sua equipe com 389 entidades produtivas e empresários.
“A gente vai avaliar e verificar o quão ela é suficiente ou não”, afirma Moreira. “Dentro dessa realidade, esse pacote, esse plano, pode se readaptar. A gente pode discutir, aprimorar”, explica.
De modo geral, as medidas foram bem recebidas pelos setores, segundo relatos colhidos pelo g1. Ainda assim, a indústria enfrenta um desafio adicional: a adaptação de sua produção ao perfil de consumo dos norte-americanos.
Calçados, por exemplo, são fabricados conforme o padrão de numeração e estilo dos EUA, o que dificulta a redireção imediata das exportações para outros mercados. O mesmo ocorre com autopeças.
Setor calçadista de Franca tem impactos com tarifas de 50% dos EUA
“No curto prazo, ações como o Brasil Soberano ajudam as empresas mais expostas, mas no médio e longo prazo o importante é não sair da mesa de negociações com os americanos e ao mesmo tempo tentar diversificar destinos atendidos, nossa pauta de produtos e aumentar o número de empresas brasileiras que exportam”, sugere Cagnin.
“Muito disso depende da agenda competitividade e da redução do Custo Brasil, algo que já deveríamos ter feito há muito tempo. Temos o acordo Mercosul-União Europeia, que seria interessante ver implementado, assim como outros acordos bilaterais que abrissem novos mercados”, conclui.



Conteúdo Original

Posts Recentes

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE