Com informações de Diário do Rio. Poucos animais são tão injustiçados na paisagem urbana do Rio de Janeiro quanto os gambás. Basta uma aparição rápida no quintal, no telhado ou atravessando a rua ao cair da noite para que o preconceito venha à tona, quase sempre acompanhado de gritos, medo e, pior, violência gratuita. Mas está na hora de a cidade olhar para esses pequenos marsupiais com mais calma, mais informação e um pouco mais de humanidade.
Diferente do que muitos pensam, o gambá, também conhecido como saruê, não é um invasor, nem uma ameaça, nem um “bicho sujo”. Ele é, na verdade, um aliado silencioso da saúde urbana. Alimenta-se de insetos, baratas, caramujos, pequenos roedores e, sobretudo, de escorpiões, uma das pragas que mais preocupa moradores de áreas urbanas e que cresce justamente onde o equilíbrio ambiental foi rompido. Onde há gambás, há menos escorpiões.
Além disso, esse pequeno marsupial, de hábitos noturnos e passos tímidos, não ataca pessoas, não persegue animais domésticos e não representa perigo quando deixado em paz. Seu mecanismo de defesa mais famoso — fingir-se de morto — é quase comovente: diante do medo extremo, ele não reage com agressividade, mas com rendição. Ainda assim, é morto, atropelado, espancado ou envenenado todos os dias, como se fosse culpado de algo que jamais fez.
Os gambás na paisagem urbana da cidade maravilhosa
No Rio, os gambás estão por toda parte, especialmente onde ainda há árvores, jardins, encostas e fragmentos de mata. São vistos com frequência na Barra da Tijuca, em Santa Teresa, na Gávea, no Jardim Botânico, no Alto da Boa Vista, em Jacarepaguá e até em áreas centrais mais arborizadas. Eles não “invadem” a cidade — a cidade é que avançou sobre o território deles. O gambá apenas sobrevive, adaptando-se como pode a um espaço cada vez mais hostil.
Há algo de profundamente simbólico nisso. Em uma cidade que se orgulha da sua natureza, mas que tantas vezes reage com violência ao que não entende, o gambá acaba virando bode expiatório de medos irracionais. Confunde-se cheiro com perigo, aparência com ameaça, ignorância com justificativa. E assim se mata um animal que presta um serviço ambiental valioso, gratuito e insubstituível.
Proteger o gambá não é apenas um gesto de compaixão; é uma escolha inteligente. É compreender que a vida urbana não se faz só de concreto, mas também de pequenos equilíbrios invisíveis. É aceitar que nem todo animal bonito é útil — e que nem todo animal “feio” é descartável. O gambá limpa, controla pragas, dispersa sementes e ajuda a manter um ecossistema urbano menos doente.
Da próxima vez que um gambá surgir no quintal, no muro ou na rua, talvez valha trocar o susto pela curiosidade, o impulso pela informação. Ele não está ali para atacar, mas para cumprir, silenciosamente, o seu papel. Em tempos em que a cidade luta para reencontrar harmonia com o ambiente que a cerca, talvez esses pobres marsupiais nos ensinem uma lição simples e poderosa: conviver é sempre melhor do que destruir.
2025-12-22 16:47:00



