Um crime cada vez mais recorrente tem afetado o dia a dia dos moradores do Rio. O furto de cabos de energia elétrica e de fibra ótica deixa às escuras casas, hospitais e escolas, corta a conexão das pessoas e das empresas e interfere até no trânsito das cidades ao apagar os sinais. Nesta quinta-feira, uma ação de agentes da Delegacia de Roubos e Furtos (DRF), com apoio da Polícia Civil do Paraná, mirou uma quadrilha integrada por técnicos que se embrenhavam por galerias subterrâneas para retirar fios de cobre. Tudo com o apoio de batedores armados do Comando Vermelho. De acordo com Jefferson Ferreira, delegado titular da DRF, os criminosos forjavam uniformes e crachás de empresas dos ramos de energia elétrica e telecomunicações para dar um ar de legalidade à ação, além de apresentarem alvarás falsificados que as permitiam acessar as subestações subterrâneas.
- Caminhos do Cobre: Operação prende sete suspeitos de integrar quadrilha que usava caminhões para furtar cabos subterrâneos e agia com batedores
- Criminosos na mira: Investigação comprova que técnicos do setor de energia eram captados para furtar fios de subestações do Rio
— Essas pessoas eram escolhidas pelo conhecimento técnico em cobre e energia. Assim, elas eram capazes de evitar problemas, como choques ou danos aos materiais retirados — explica o delegado, revelando que cada uma delas ganhava cerca de R$ 200 por furto.
Na operação Caminho do Cobre II, sete pessoas foram presas — duas em flagrante. A Justiça determinou ainda o bloqueio de R$ 200 milhões em contas bancárias e bens dos suspeitos, além do cumprimento de 46 mandados de busca e apreensão no Rio e em São Paulo. Os agentes estiveram em endereços de pessoas ligadas à quadrilha, em sete ferros-velhos e em metalúrgicas.
— Conseguimos comprovar a vinculação de grandes empresários do meio de reciclagem e ferros-velhos com o Comando Vermelho — disse o secretário de Polícia Civil, Felipe Curi.
Só num depósito em Campo Grande foram encontradas 200 toneladas de material.
— Quando a Caminhos do Cobre foi criada, demos um duro golpe nesse mercado ilegal de comercialização de cabos furtados. Agora, vamos atuar contra a lavagem de dinheiro. Esse é só o início de um novo trabalho, que vai contar com ações contínuas — afirmou o secretário.
- Preso no caso Marielle: Câmara cassa mandato de Chiquinho Brazão por ausência em sessões
As investigações, que levaram à denúncia de 22 integrantes do grupo criminoso, assinada pela promotora Elisa Pittaro, da 2ª Promotoria de Investigação Penal de Nova Iguaçu, revelaram um esquema sofisticado. O furto era de cabos de subestações e redes subterrâneas. O dinheiro arrecadado com o crime, afirma a polícia, era lavado por meio de transações bancárias fracionadas, aquisição de veículos de luxo, emissão de notas fiscais falsas e simulação de contratos com empresas reais.
Os cabos eram furtados por técnicos aliciados que usavam uniformes de concessionárias. Imagens obtidas pelos policiais mostram que os criminosos usavam caminhões para puxar a fiação das galerias. A ação era “protegida” por traficantes armados. O grupo também tinha falsas ordens de serviço para apresentar em caso de abordagem por parte de funcionários das empresas ou agentes públicos.
O material era escoltado por batedores do tráfico até depósitos em favelas em Queimados, na Baixada Fluminense; no Morro Fallet-Fogueteiro, no Rio Comprido; e no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, onde os fios eram desencapados. Parte deles era queimada para retirar o plástico. Em seguida, o material era repassado para empresas de reciclagem ligadas aos próprios chefes da quadrilha, de acordo com a polícia, antes de ser revendido para metalúrgicas do Rio e de São Paulo. Um percentual do faturamento ficava com os traficantes, que davam proteção para que o furto fosse cometido.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, a quadrilha era dividida em três núcleos: comando, intermediário e operacional. O primeiro deles era responsável pelo planejamento, pela coordenação e pela tomada de decisões do bando, abrangendo desde a definição dos alvos dos furtos até a destinação e a lavagem do dinheiro ilícito. O segundo era integrado por pessoas que atuavam na receptação, na ocultação e na comercialização do material furtado. Já os executores do furto ficavam no terceiro grupo. Ao todo, 15 pessoas responsáveis por esta última etapa foram identificadas na investigação que começou em novembro do ano passado.
Segundo a polícia, o chefe do grupo criminoso era o jornalista Ricardo Lyra Ribeiro, também apontado como o elo com o tráfico do Fallet-Fogueteiro. Ele atuava como contador da facção, controlando repasses, fluxo financeiro e lavagem de dinheiro por meio de empresas reais. Lyra foi preso pela Polícia Civil do Paraná ano passado por suspeita de fazer a ponte entre fornecedores de drogas daquele estado e traficantes cariocas. A mulher dele é acusada de ter assumido a chefia da quadrilha após a captura dele, comandando pagamentos, lavagem de dinheiro, contratos simulados e gerenciamento de empresas, afirma a Polícia Civil do Rio. Ela foi presa nesta quinta-feira.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2025/Q/Q/0wh1b0SFaxB49QgxtCRg/110812921-ri-rio-de-janeiro-rj-24-04-2025-policia-civil-deflagra-segunda-fase-da-operacao-caminhos-d.jpg)
- No Rio, CV e PCC fazem acordo e avançam para mercados de internet e combustível
Um dos alvos dessa quadrilha, a concessionária Light contabilizou 135 quilômetros de fios furtados de suas galerias subterrâneas, entre 2024 e abril de 2025. O total é suficiente, por exemplo, para cobrir a distância entre a cidade do Rio e Volta Redonda, no Sul Fluminense. Segundo a empresa, as ações criminosas causaram, entre outros danos, interrupções de fornecimento de luz, oscilações e até sobrecargas do sistema.
Só nos quatro primeiros meses deste ano, foram furtados 58 mil metros de cabos. Os que mais sentiram os transtornos causados pelos ladrões foram os moradores de bairros da Zona Sul, do Centro e da Barra da Tijuca.
— As áreas mais afetadas são Ipanema, Copacabana, Centro e Barra da Tijuca. São os locais que a gente teve maior incidência de furtos, até agora, em 2025. Já no ano passado, os bairros com mais casos foram Centro, Copacabana, Leblon e Ipanema. Mas o que a gente pode destacar é que, mais do que o prejuízo que a Light tem, é o prejuízo que isso traz para toda a população. Este crime afeta diretamente serviços essenciais, como hospitais e transporte — revelou Leonardo Bersot, gerente de manutenção da rede subterrânea da Light.
Já a Conexis, sindicato que reúne empresas de telecomunicações, revelou que, em 2022, as concessionárias de telefonia tiveram mais de 504 mil metros de cabos furtados no Estado do Rio. Em 2023, os ladrões furtaram 137.643 metros de fios. A última contabilização do setor foi feita no primeiro semestre de 2024, com 50.198 metros.
2025-04-25 03:00:00