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Com informações de O Dia. “Estou há mais de quatro anos tentando conseguir meu auxílio-doença com o INSS. Como não posso trabalhar, esse valor seria fundamental para poder ajudar nas contas de casa. Nos últimos anos, minha mulher está tendo que custear tudo sozinha e ainda temos dois filhos pequenos”, contou João Félix de Oliveira Filho, de 55 anos, morador de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, que busca seus direitos. Essa é a realidade de mais de 2,6 milhões de trabalhadores brasileiros que estão na fila do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) requerendo os benefícios previdenciários garantidos pela Constituição.
Segundo os dados do INSS referentes a agosto, o Rio de Janeiro é o quinto estado com maior número de processos em análise, estando mais de 162 mil pessoas à espera da resolução dos seus requerimentos. Em comparação com o mesmo período de 2024, o valor triplicou este ano, com cerca de 109 mil pedidos a mais.
Para tentar reverter o aumento expressivo da fila e acelerar a análise dos pedidos, o governo federal criou o Programa de Gerenciamento de Benefícios (PGB), que prevê o pagamento de bônus a servidores que trabalham além da jornada regular. No entanto, o dirigente do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social no Estado do Rio de Janeiro (Sindsprev-RJ) Carlos Vinícius Lopes explica que a ação é apenas um “paliativo” para o problema, pois não resolve a questão estrutural.
“Essas medidas, como os mutirões e as gratificações, são apenas paliativas e estão muito longe de solucionar o problema, que possui raízes profundas. A pressão sobre os servidores e o excesso de demandas vão continuar e podem ocasionar em questões ainda mais sérias. Elas, que eram por um momento, viram definitivas, acarretando aumento do trabalho, além de assédio moral por colocar metas inatingíveis. Se estão sendo utilizadas medidas paliativas, quer dizer que o governo está errando em algum lugar”, afirma Lopes.
Neste ano, o INSS promoveu no Estado 30 mutirões com perícias médicas e atendimentos sociais, além de 25 ações extras nos fins de semana, voltadas exclusivamente ao serviço social. Ao todo, já foram prestados mais de 4,2 mil atendimentos nessas iniciativas.
Em 2015, a instituição possuía cerca de 37,3 mil servidores ativos, enquanto atualmente há 19,4 mil funcionários, o que representa uma redução de aproximadamente 48% do quadro de trabalhadores. Por isso, o dirigente analisa que há uma sobrecarga generalizada sobre eles, os quais não conseguem cumprir com a demanda de trabalho.
“Desses 19 mil funcionários, cerca de 50% estão em vias de se aposentar, além de que poucos são aqueles que atuam nas áreas de benefícios. A falta de investimentos e de concursos públicos só vai dificultar a eficiência do setor e, consequentemente, aumentar as filas. Foi preciso acontecer a fraude para ver que os serviços são defasados, com muitos sistemas desatualizados dificultando o trabalho. É necessário uma reforma brusca no setor, caso contrário, os problemas continuarão a crescer e a população continuará sendo prejudicada”, alerta.
Além da redução do quadro de servidores, o INSS enfrenta problemas relacionados à gestão e ao combate às irregularidades. Em abril, a Polícia Federal realizou uma operação que investigou fraudes na autarquia, após descobrir que entidades cobravam mensalidades de aposentados e pensionistas sem autorização. Segundo as estimativas, os desvios ocorreram entre 2019 e 2024 podem chegar a R$ 6,3 bilhões. Enquanto isso, os segurados aguardam anos para ter acesso a direitos garantidos em lei.
Segurados vivem incerteza
O benefício por incapacidade é a modalidade mais solicitada no INSS, sendo cerca de 47% dos pedidos no Estado, com mais de 75 mil solicitações. É o caso de João Félix de Oliveira Filho, de 55 anos, morador de Belford Roxo. Ele trabalhava como motorista, mas precisou entrar com requerimento de auxílio-doença devido a problemas de saúde.
“Estou há anos esperando pelo benefício. Procurei um advogado para entrar na Justiça após ter meu pedido negado duas vezes pelo INSS. Eles dizem que os documentos estão incompletos, porém já fiz de tudo e até agora não consegui que reconhecessem meus direitos”, conta João.
Oliveira Filho relata que, sem o auxílio, não consegue arcar com o tratamento da doença: “Minha mulher está tendo que cobrir sozinha todas as contas da casa, e temos dois filhos pequenos. No momento, não posso continuar meu tratamento por falta de dinheiro. Minha saúde está piorando cada vez mais”, afirmou.
Em agosto, a segunda modalidade com mais solicitações no Rio de Janeiro foi a de benefícios assistenciais, com pouco mais de 51 mil pedidos. Um exemplo dessa demanda é o caso de Nilene Santos Leitão, de 48 anos, diarista que mora na Ilha do Governador. Ela entrou com a solicitação do benefício para o filho portador do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ela afirma que espera há três anos por uma resposta do INSS.
“Aguardei por dois anos antes de recorrer ao auxílio de um advogado. Já tentei de tudo. Fui três vezes a uma agência do INSS. Cheguei a conseguir marcar uma perícia médica para meu filho ser atendido, mas, devido a uma greve, ela não foi realizada e o pedido foi encerrado sem qualquer justificativa”, explicou.
Nilene ressalta que precisa do dinheiro para ajudar nos cuidados do filho: “Resolvi procurar meus direitos, após tentar conseguir terapias no SUS [Sistema Único de Saúde] e ter meu pedido negado. Não tenho condições de arcar com os custos das sessões. Até agora, ele não pode fazer nenhuma. O processo de solicitação é muito burocrático, o que acaba complicando a resolução dos requerimentos”, reclama.
Sandra Alcina Marques, de 57, moradora do Recreio dos Bandeirantes, na Zona Sudoeste, busca garantir a aposentadoria por tempo de contribuição, após anos trabalhando como assistente administrativa.
“Quando meu pedido foi negado, não sabia a quem recorrer. Na sequência, preferi procurar um advogado, pois no portal da instituição aparece que estou apta a me aposentar, mas não consigo receber o benefício. Inicialmente, pensei que seria fácil e rápido, porém até agora sem nenhuma solução”, explica Sandra.
Ela afirma que os prazos do INSS deveriam ser mais ágeis, depois de passar meses angustiada até receber o retorno negativo do requerimento.
“A resposta veio por e-mail, informando que eu não completava os requisitos, enquanto no site consta que estou apta. A situação está afetando tanto minha condição financeira quanto minha saúde. Acho que deveriam agilizar o processo e esclarecer melhor como funciona”, avalia.
Saiba quais são os direitos dos segurados
Com a demora para análise dos requerimentos, o número de pessoas na fila do INSS tem aumentado. Em agosto do ano passado, havia cerca de 1,1 milhão de segurados solicitando os benefícios, enquanto atualmente o número mais que dobrou, ultrapassando os 2,6 milhões. A situação tem gerado insatisfações dos brasileiros e os levado a buscar a Justiça para conseguir seus direitos.
O advogado previdenciário Eduardo Luiz Gomes Teixeira explica que, no geral, o segurado têm direito de receber uma resposta do INSS em até 30 dias, prorrogáveis por mais 30. Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que, a depender do benefício, o prazo pode ser mais longo, chegando a até 90 dias. Caso o pedido seja negado, é possível solicitar explicações e recorrer, tanto administrativamente quanto judicialmente.
“Se houver atraso excessivo na concessão do benefício, o segurado pode formalizar uma reclamação na Ouvidoria da instituição. Além de ter o direito a solicitar informações pelo aplicativo ou procurar órgãos como a Defensoria Pública da União, o Ministério Público Federal ou o Ministério da Previdência Social, registrando a reclamação pelo site Fala.BR. Se a espera for demasiadamente longa, ele pode ingressar com uma medida judicial para exigir a análise do pedido ou a própria satisfação de sua pretensão”, orienta.
Teixeira destaca que o recurso administrativo no próprio INSS, que será analisado pela Junta de Recursos da Previdência Social, na maioria dos casos, é uma condição prévia para iniciar uma ação judicial. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o órgão acumula mais de 5 milhões de ações judiciais, o que representa cerca de 4,97% dos processos em tramitação na Justiça brasileira, sendo a instituição mais processada do País.
“O tempo médio de um processo judicial varia conforme a complexidade do caso e a região em que tramita, podendo durar de um e três anos, dependendo do andamento do Judiciário. No entanto, não há um prazo definido para a conclusão”, explicou.
A digitalização de serviços, como a plataforma do Meu INSS, tem ajudado a reduzir as filas nas agências da Previdência. No entanto, muitos segurados ainda enfrentam dificuldades em utilizar esses recursos, especialmente em regiões com acesso limitado à internet. O advogado aponta que a tecnologia tem mascarado um pouco da demora das análises, com as “filas invisíveis”.
“Em relação ao atendimento, apesar dos avanços trazidos pela digitalização e pelo atendimento telefônico, é necessário melhorar o suporte nos canais on-line e nos atendimentos presenciais para efetivamente processar a análise dos requerimentos dos seus segurados, especialmente para aqueles sem acesso à tecnologia. O que lamentavelmente ocorre é a ‘fila invisível’ ou ‘fila digital’”, conclui.
Apesar das iniciativas como mutirões e atendimentos extras, o Rio de Janeiro registrou em agosto o maior número de pessoas na fila do INSS desde abril, quando havia mais de 167 mil segurados aguardando análise de benefícios. Para quem espera, a demora pode significar adiar tratamentos, comprometer a renda familiar ou a necessidade de se recorrer à Justiça para tentar garantir o benefício.
2025-09-21 17:27:00