Dias antes de ser executada em Cascadura, na Zona Norte do Rio, a traficante conhecida como Diaba Loira, ligada ao Terceiro Comando Puro (TCP), publicou um vídeo nas redes sociais revelando os bastidores da polêmica envolvendo o influenciador Hytalo Santos, que teria sido agredido em um baile funk no Complexo da Penha. O caso aconteceu em outubro do ano passado, durante uma visita do influenciador na capital fluminense, que incluia um baile funk na comunidade, onde ele e sua trupe se envolveram em uma briga com direito a luta corporal e telefones quebrados.
Diaba Loira acusou CV de agredir influenciador em baile na Penha
A controvérsia voltou a ganhar repercussão recentemente, após Hytalo se tornar suspeito de crimes como tráfico humano e exploração sexual infantil. Ele também foi citado no vídeo sobre a “adultização” do youtuber Felipe Bressanim, o Felca, que alcançou milhões de visualizações no YouTube e levou parlamentares a discutirem novas regras para a proteção de jovens na internet.
No registro, Eweline Passos Rodrigues, de 28 anos, que há pouco tempo havia migrado do CV para o TCP, afirmou que, ao contrário do que foi divulgado pelo próprio influenciador em suas redes, Hytalo teria sim apanhado de criminosos ligados ao Comando Vermelho (CV). Segundo ela, o influenciador foi obrigado a negar a agressão publicamente.
“A questão daquela vez que ele tinha apanhado lá na Penha e no fim ele acabou sendo obrigado a falar que ele não tinha apanhado, que era tudo mentira e que o CV não tinha nada a ver com isso e eram pessoas super receptivas, mas na real ele apanhou. E foi sem motivo algum. Só por causa de birra e ciúme dos caras. A verdade foi essa”, disse a traficante.
Ela ainda acusou os criminosos de obrigarem Hytalo a gravar um vídeo desmentido a suposição de que os traficantes teriam feito parte da confusão, elogiando a comunidade e negando a agressão.
“Eles ficaram irritados com ele por ciúme bobo e acabaram batendo nele, depois obrigando ele a ir lá e falar que foi tudo mentira, tudo invenção das pessoas e que ele amava a Penha. Não foi ele que quis fazer, ele foi obrigado a fazer, porque além de agressores, eles são opressores também,”, completou.
O influenciador, que tinha milhões de seguidores, já havia relatado que a confusão no baile começou após provocações contra jovens que o acompanhavam, e que acabou sendo atingido por uma “voadora” quando deixava o local. Apesar disso, em vídeo publicado posteriormente, garantiu que foi bem recebido na Penha e negou a versão de que teria apanhado de traficantes.
“Fomos conhecer pontos turísticos no Rio de Janeiro, conhecemos um lugar maravilhoso, onde fui muito bem recepcionado, mas como em todo lugar maravilhoso, sempre tem alguma coisa que pode acontecer, só que eu tenho a vida exposta, então tudo aumenta”, disse Hytalo, no vídeo.
Preso na última sexta-feira em São Paulo, o influenciador paraibano Hítalo José Santos Silva, que se apresenta com o nome artístico de Hytalo Santos, virou um dos nomes mais comentados na internet após ser denunciado em um vídeo do youtuber Felca por crimes como pedofilia e exploração de menores. O jovem de 28 anos é investigado por suspeita de crimes como tráfico humano e exploração sexual infantil.
Hytalo Santos, natural de Cajazeiras, no Sertão da Paraíba, ganhou projeção nas redes sociais por ‘adotar’ crianças e jovens, emancipados ou não, a quem chamava de ‘crias’, e expor a convivência dos menores entre si e com outras pessoas. As ‘crias’ eram abrigadas em imóveis nos quais eram organizados diversos ‘reality shows’ exibidos nas redes sociais.
Com a popularização dos vídeos, que incluiam dinâmicas e ‘brincadeiras’ de cunho sexual, outras crianças e adolescentes de diversos estados e que já atuavam como influencers nas redes sociais foram ‘incluídas’ no grupo, que era chamado de ‘Turma do Hytalo’.
Kamylinha Silva foi a primeira menor a ser exposta pelo influenciador, ainda no ano de 2018, quando tinha 12 anos de idade. Em entrevista ao podcast Poddelas, Hytalo disse que a conheceu em uma aula de dança na cidade de Bayeux (PB), onde moram até hoje.
Há cerca de três meses, os dois chegaram a anunciar que Kamylinha estava grávida do irmão de Hytalo, o influenciador Hyago Santos, que é maior de idade. A gravidez teria sido interrompida dois meses depois após Kamylinha sofrer um aborto espontâneo.
No vídeo, que tem como título o termo “adultização” e já acumula quase 40 milhões de visualizações, são expostos conteúdos publicados por Hytalo que contém crianças e adolescentes sendo sexualizados publicamente e até mesmo tendo relações e comportamentos sexuais com outros menores.
Após a repercussão do caso, a Meta derrubou os perfis de Instagram de Hytalo e ‘Kamylinha Santos’, uma adolescente de 17 anos que participava dos conteúdos e se apresentava como “filha adotiva” do acusado. Em um posicionamento publicado na semana passada, Hytalo afirmou já ser alvo de uma denúncia do Ministério Público da Paraíba (MPPB) desde 2024 por conta dos mesmos crimes.
Nos conteúdos postados pelo influenciador, bem como no vídeo de denúncia publicado por Felca, a jovem aparece tendo interações de cunho sexual com outros jovens e dançando de maneira sugestiva com pouca roupa em ambientes privados e públicos. Em um trecho, ela é vista dançando em cima do palco de uma festa, onde é filmada por adultos.
Antes do banimento da conta, Kamylinha tinha cerca de 11 milhões de seguidores no Instagram, enquanto a conta de Hytalo ostentava mais de 12 milhões de fãs. O influenciador também era responsável pelo perfil “Fartura Premiações”, no qual organiza rifas e sorteios de prêmios
Quem é a traficante Diaba Loira?
Antes de mergulhar de vez no mundo do crime, Eweline Passos Rodrigues trabalhou como revendedora de cosméticos, vendedora de trufas e até como alfaiate, com salários que variavam entre R$ 1.017 e R$ 1.346. Em Tubarão, sua cidade natal, em Santa Catarina, levava, aparentemente, uma rotina comum e uma vida profissional relativamente estável antes de se envolver com o tráfico e as facções criminosas. No nome dela, também há uma empresa voltada para promoção de vendas, registrada em Tubarão, sua cidade natal, em Santa Catarina, com capital social de R$ 3 mil.
Com o dinheiro da venda das trufas, Eweline pagava a mensalidade do curso de Direito numa universidade de Santa Catarina. Ela, inclusive, usava os estudos como slogan do negócio: “Adoce seu dia com essas delícias e me ajude na faculdade”.
Segundo a Polícia Civil catarinense, Diaba Loira vira traficante após sofrer uma tentativa de feminicídio em 2022, em Capivari de Baixo, município de cerca de 24 mil habitantes. Ela foi atacada com uma facada no pulmão pelo ex-companheiro enquanto buscava o filho pequeno, precisando passar por cirurgia de emergência.
Eweline também justificou a transformação na vida num vídeo publicado este ano no TikTok: “Foi culpa da polícia que não fez nada por mim lá em Santa Catarina. Antes de julgar, vem ver a nossa história”.
— A primeira vez que me deparei com a Eweline foi quando ela foi vítima de uma tentativa de feminicídio. O sujeito e a família alegavam que ela havia se apossado de uma quantia em dinheiro dele — contou o delegado André Crisóstomo, da 5ª DRP, em Tubarão.
Segundo o policial, o ex-marido de Eweline trabalhava em outro estado e relatou que, ao voltar a Santa Catarina, descobriu que Eweline o traía e havia se apropriado do dinheiro que ele enviava para ser guardado.
A dinâmica do crime aparece resumida no recurso em habeas corpus em favor do ex-companheiro, negado no Superior Tribunal de Justiça no ano passado. Nele, há a informação de que o homem a atacou pelas costas, dando-lhe uma facada que perfurou o pulmão, durante uma briga na casa onde moravam — e onde estavam seus dois filhos.
Ela foi socorrida pela mãe, a sogra e conhecidos, e passou por uma cirurgia de emergência. Eweline tinha contra o agressor medidas protetivas, todas desrespeitadas. O processo do crime, que está em segredo de Justiça, foi concluído com a absolvição do ex-companheiro dela.
Após o ataque, a Polícia Civil de SC passou a investigá-la por tráfico de drogas em Tubarão. Segundo o delegado, eweline já tinha conexões suspeitas com traficantes da região. Enquanto aguardavam a expedição de um mandado de busca e apreensão, Eweline foi presa em flagrante pela Polícia Militar em maio de 2023, por tráfico de drogas.
Em janeiro de 2024, veio a segunda prisão. Já investigada por integrar uma organização criminosa, ela e um comparsa, chamado Ruan Carlos dos Santos, foram detidos por porte ilegal de arma de fogo, com provas de que se deslocavam para executar outro desafeto. Em determinação judicial, Eweline Passos Rodrigues passou a ser monitorada por tornozeleira eletrônica.
— A sequência dos elementos deixava claro que ela fazia parte de uma facção catarinense e atuava também em Florianópolis — afirmou Crisóstomo.
Diaba Loira chegou a receber o direito de responder em liberdade e foi solta, usando uma tornozeleira eletrônica. No entanto, após Eweline romper duas vezes o monitoramento, o delegado Pereira solicitou novamente sua prisão, e ela se tornou foragida da Justiça. Ainda naquele ano, seu destino foi a capital fluminense, onde buscou abrigo em redutos do Comando Vermelho no Rio: primeiro no Complexo do Alemão, na Zona Norte, e depois na Gardênia Azul, na Zona Oeste.
— Nesse período, recebíamos diversas fotos e vídeos dela portando fuzis nas favelas cariocas — contou Pereira.
O apelido “Diaba Loira” surgiu após sua chegada ao Rio, coincidindo com sua notoriedade nas redes sociais, onde coleciona cerca de 92 mil seguidores e compartilhava vídeos portando armas pesadas. Até pouco antes, era conhecida como “Pitbull”.
Em junho deste ano, voltou a chamar atenção ao ser vista atirando contra policiais durante uma operação na Gardênia Azul.
Em vídeos, a Diaba Loira já deixava claro que havia migrado de facção e contava que não temia ser executada por traficantes rivais por classificá-los como “despreparados”.
“É para eu ter medo? Eu estava do lado de vocês esse tempo todinho, sei que vocês são despreparados. Então antes de falar que a ‘equipe caos’ vai te pegar, parem de querer ameaçar, está chato já. Quem faz não fala”, dizia em um dos vídeos
Em julho, publicou um vídeo lamentando a morte da mãe, afirmando que ela teria sido assassinada por criminosos rivais do CV. Na realidade, a mãe está viva e chegou a se apresentar na delegacia de Tubarão para esclarecer a suposta morte da filha.
“Vocês pegaram a minha família, mataram a minha mãe. Vocês destruíram a única pessoa que eu tinha. Acabaram com ela, mesmo sabendo que ela morava sozinha e quase não falava comigo. Esses filhos da p*ta do Comando Vermelho sabiam”, disse Diaba Loira num vídeo publicado em julho deste ano.
Eweline também confirmou publicamente sua aliança com o TCP, compartilhando conteúdo ligado à Tropa do Coelhão, liderado pelo traficante William Yvens Silva, grupo ligado ao TCP no Complexo da Serrinha, em Madureira, Zona Norte do Rio, cujo chefe do tráfico é um dos criminosos mais procurado do Rio, Wallace Brito Trindade, o Lacosta.
2025-08-19 06:30:00