Os influenciadores alvos da Operação Desfortuna, da Polícia Civil do Rio são suspeitos de formarem uma teia que envolve a promoção irregular de jogos de azar, com indícios de lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa. Segundo as investigações, eles se aproveitavam do alto número de seguidores nas redes sociais para divulgar plataformas como a do jogo conhecido como “Tigrinho” e outros cassinos on-line — que simulam máquinas caça-níqueis, mas em ambiente digital. Embora as apostas esportivas estejam em processo de regulamentação no Brasil, essas plataformas, que funcionam como cassinos eletrônicos, são consideradas ilegais.
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— Não estamos falando de plataformas de apostas esportivas regulamentadas. O que temos aqui são jogos de azar on-line, como cassinos e máquinas caça-níquel, que são proibidos no Brasil. Essas plataformas, por estarem hospedadas fora do país, escapam do controle nacional, mas a promoção feita por influenciadores nas redes sociais para público brasileiro é crime — explicou o delegado Renan Mello, da Delegacia de Combate às Organizações Criminosas e à Lavagem de Dinheiro (DCOC-LD), responsável pela operação.
Os investigados publicavam postagens com promessas de ganhos elevados, incentivando seguidores a se cadastrar por meio de links personalizados. Em muitos casos, exibiam também um estilo de vida luxuoso — com viagens internacionais, carros caros e mansões — para induzir a ideia de que as apostas seriam o caminho certo para enriquecimento.
— Esses influenciadores estavam usando suas redes, seus milhões de seguidores, para divulgar jogos com promessas enganosas. O problema não é a existência da plataforma em si, mas a forma como ela era vendida: como se garantisse lucro fácil, o que não é verdade. A maioria das pessoas perde, e quando alguém ganha, muitas vezes nem consegue sacar o valor — afirmou o delegado. — Eles ganham em cima da perda dos outros.
De acordo com Mello, os influenciadores recebiam de duas formas: por pacotes fechados de divulgação, com valores fixos, ou por desempenho — quanto mais pessoas se cadastravam e mais dinheiro perdiam, e maiores eram os ganhos de quem promovia. A polícia ainda busca individualizar qual modelo de contrato foi adotado por cada um dos investigados.
Estrutura articulada de aliciamento
As apurações da DCOC-LD mostram que os influenciadores faziam parte de uma estrutura articulada de aliciamento. Acima deles, havia uma rede de agenciadores que ofereciam propostas de publicidade para as personalidades da internet dispostas a divulgar os cassinos on-line. Esses agentes, segundo a polícia, se apresentavam como empresários ou gestores de imagem digital, mas na verdade atuavam como elo entre os jogos ilegais e os perfis com milhões de seguidores.
— Identificamos uma estrutura bem desenhada de pessoas que atuam recrutando influenciadores. Elas não são famosas, mas servem de ponte entre as plataformas e os divulgadores. Muitas vezes, se apresentam como agenciadores, mas estão diretamente ligados ao funcionamento dessas redes de jogos ilegais — detalhou Renan Mello.
Ainda segundo o delegado, o grupo também usava empresas de fachada para movimentar o dinheiro. Relatórios do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontaram transações bancárias suspeitas que ultrapassam R$ 4 bilhões. A investigação ainda tenta rastrear a origem e o destino desse montante, o que deve avançar com a quebra de sigilo bancário e fiscal dos investigados. O material recolhido nas buscas, como celulares, contratos e dispositivos eletrônicos, será analisado com apoio do Laboratório de Tecnologia Contra Lavagem de Dinheiro da Polícia Civil.
A polícia informou que a operação teve início com incontáveis registros de ocorrência feitos por vítimas que relataram perdas financeiras após apostas nesses jogos, além de denúncias relacionadas a rifas ilegais promovidas pelos mesmos perfis. A Polícia Civil também identificou publicidade ativa até mesmo na véspera da operação.
— A orientação que deixamos é clara: não existe ganho fácil. Desconfiem de qualquer promessa milagrosa feita por influenciadores. Jamais invistam dinheiro que comprometa a subsistência da família. Essa é uma atividade viciante, que afeta diretamente o bem-estar das pessoas e, por isso, é proibida — alertou Mello.
O GLOBO tenta localizar a defesa dos suspeitos. O espaço segue aberto para qualquer manifestação.
A conexão familiar entre alguns dos alvos da operação chama a atenção. Jennifer Miranda, também conhecida como Jenny, é filha adotiva da cantora Gretchen e, segundo relatos públicos, seria mãe de Bia Miranda. Já Rafael da Rocha Buarque, também investigado, é ex-namorado de Bia e pai do filho dela. Outro nome da lista, conhecido como Gato Preto, também já foi apontado como ex de Bia.
Renan Mello destacou que a proximidade entre os influenciadores pode facilitar a cooptação para esse tipo de atividade, mas evitou cravar a existência de uma organização criminosa familiar.
— A gente tem muitos familiares, mas, na verdade, o mundo dos influenciadores muitas vezes aproxima eles e eles constroem relações de amizade. Mas não necessariamente a gente pode falar que é um empreendimento criminoso familiar — afirmou. — Isso pode ser meramente uma situação pontual. Mas existe uma proximidade entre eles, e isso pode até facilitar a cooptação de influenciadores dispostos a usar suas redes para divulgar essas plataformas e obter esses ganhos exclusivos.
2025-08-07 09:56:00