Sinos históricos somem do Museu do Trem; peças foram substituídas pelo autor do crime por réplicas de gesso

Uma atualização no banco de bens culturais procurados feita em 2025 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) trouxe à tona detalhes de um mistério que atinge parte da história ferroviária do Rio de Janeiro. Em agosto de


Uma atualização no banco de bens culturais procurados feita em 2025 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) trouxe à tona detalhes de um mistério que atinge parte da história ferroviária do Rio de Janeiro. Em agosto de 2022, 16 sinos de bronze, usados em ferrovias e estações e fabricados entre o fim do século 19 e o início do século 20, foram furtados do Museu do Trem, localizado ao lado do Estádio Nilton Santos, no Engenho de Dentro, na Zona Norte do Rio. A maioria das peças furtadas — que seguem desaparecidas — foi substituída pelo autor do crime por réplicas de gesso.

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Parte de uma coleção de bens tombados pelo patrimônio histórico, os sinos estavam em uma sala do museu. Mesmo fechada para visitação pública desde 2017, por conta de obras emergenciais, a instituição conta com vigilância armada 24 horas e com concertinas clipadas nos muros.

Uma investigação da Polícia Federal (PF) não encontrou sinais de invasão ou arrombamento. O museu tem em seu acervo a locomotiva a vapor Baroneza (na grafia antiga, com z), construída na Inglaterra e a primeira a trafegar no Brasil na inauguração da Estrada de Ferro Mauá, em 1854. Guarda, ainda, entre outras peças, o carro imperial de Dom Pedro II e o carro do rei Alberto, que transportou o monarca belga na década de 1920. Há ainda o vagão usado pelo ex-presidente Getúlio Vargas.

O furto dos sinos só foi percebido quando um funcionário foi limpar o local e descobriu que as peças originais haviam sido substituídas por outras de gesso. Além dos sinos — que tinham, em média, peso variando entre cinco e oito quilos e altura de 40 centímetros cada — também foi constatado o desaparecimento de uma bobina de um carro dos bombeiros, pertencente à antiga Estrada de Ferro Leopoldina.

Um relatório feito por uma historiadora e um museólogo, destinado ao Iphan e ao qual o EXTRA teve acesso, diz que a perda cultural causada pelo furto é inestimável, com prejuízo calculado em R$ 240 mil. A documentação também diz que os bens não tinham predicados suficientes para serem negociados com pessoas ligadas ao mercado de antiguidades e arte. Assim, o valor metálico do bronze pode ter despertado o interesse de quem praticou o crime.

Agentes da Delegacia de Repressão a Crimes Contra o Meio Ambiente e Patrimônio Histórico da PF chegaram a localizar, em casas de leilão, três sinos suspeitos, mas exames periciais descartaram a possibilidade de que fossem os originais. Uma perícia papiloscópica feita no local também não encontrou digitais dos criminosos. O museu, que não contava com circuito de segurança, também não possuía imagens que ajudassem nas investigações. Sem pistas ou provas, o Ministério Público Federal (MPF) arquivou o caso.

MP arquiva caso por falta de provas

Por causa do furto, o Iphan abriu processo administrativo contra a empresa de vigilância responsável na época. Foi aplicada uma multa de R$ 33 mil, além de um pedido de ressarcimento de R$ 240 mil, valor estimado dos sinos furtados. A empresa recorreu, e o caso segue sendo discutido na Justiça.

No local, pichações evidenciam o abandono. O museu, herança da extinta Rede Ferroviária Federal, foi inaugurado em 1984, mas ocupa prédios do século 19. A antiga oficina de locomoção tem 6 mil metros quadrados, com um galpão onde está o acervo em inventário e uma fachada em ruínas, ambas sinalizadas como “Museu do Trem”.

‘Me sinto envergonhado’, diz engenheiro sobre abandono

Do lado de fora do Museu do Trem, duas locomotivas, um vagão de passageiros e peças da ferrovia estão cobertas por estruturas simples, cercadas por mato. Para Hélio Suêvo, diretor da Associação de Engenheiros Ferroviários, a situação é lamentável.

— Eu me sinto envergonhado, como engenheiro ferroviário, vendo a situação de penúria que se encontra o museu. Nossa luta é pela preservação da memória ferroviária e pela reabertura do museu — disse.

Apesar de uma sentença judicial de 2017 obrigar o Iphan a realizar obras emergenciais no local, nada foi feito, segundo o procurador da República Sergio Suiama. Ele informou que a maior parte de uma verba de R$ 30 milhões foi perdida por falta de projeto e que o MPF agora cobra judicialmente a execução da sentença.

— Já temos uma sentença que obriga a União a cumprir aquelas obrigações relacionadas ao Museu do Trem. Como o Iphan não cumpriu, e todos os prazos estipulados já acabaram, a gente está executando isso judicialmente — afirmou o procurador.

O Iphan diz que está finalizando um projeto de restauração e fazendo o inventário das peças. Ainda não há previsão para início das obras. Em 2024, coberturas provisórias foram instaladas sobre o acervo externo.

Em petição recente, Suiama reforçou que o museu continua fechado e com o acervo vulnerável ao tempo e a novos furtos. Ele pediu à Justiça que o Iphan comprove a reserva de recursos para a restauração e apresente um cronograma com prazos para a execução das obras.



Conteúdo Original

2025-07-20 10:00:00

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