‘Ele achou que o primeiro negro que viu na rua era o bandido e atirou?’ questiona irmã de morto por PM em SP

Um policial militar de folga matou por engano, com um tiro na cabeça, um homem que saía do emprego na noite da última sexta-feira, em Parelheiros, na região Sul de São Paulo. Guilherme Dias Santos Ferreira, um jovem negro de


Um policial militar de folga matou por engano, com um tiro na cabeça, um homem que saía do emprego na noite da última sexta-feira, em Parelheiros, na região Sul de São Paulo. Guilherme Dias Santos Ferreira, um jovem negro de 26 anos, havia acabado de deixar a marcenaria onde trabalhava e corria em direção ao ponto de ônibus, a cerca de 50 metros do local onde foi atingido. Com ele, foram encontrados carteira, celular, remédios, um livro com frases bíblicas, marmita, talheres e itens de higiene. Não havia nenhuma arma de fogo.

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O PM Fabio Anderson Pereira de Almeida, de 35 anos, afirmou em depoimento que sofreu uma tentativa de assalto e, depois de reagir, empreendeu uma perseguição aos criminosos. Preso em flagrante por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, ele pagou R$ 6,5 mil de fiança e foi solto depois do registro da ocorrência para responder em liberdade. A Corregedoria afastou o agente das ruas até a conclusão das apurações.

— O policial diz que sofreu a tentativa de assalto. Aí o primeiro negro que ele viu na rua, andando para pegar o ônibus, achou que era o bandido e atirou? Ele atirou no meu irmão porque ele era preto. A gente está cansado de ser morto por ser o que é — desabafou Emanuelle Dias Santos, de 30 anos, irmã de Guilherme.

Uma mulher também foi atingida por um disparo de arma de fogo no braço. Ela foi socorrida e liberada. A defesa do policial informou que não se manifestará neste momento.

Ferreira era o terceiro de cinco filhos. Emanuelle conta que o irmão era um homem bom, religioso e trabalhador — ele estava há três anos na mesma empresa. Na noite em que foi morto, inclusive, fazia hora extra para juntar dinheiro e conseguir reformar a casa. Casado há pouco menos de dois anos, o sonho do rapaz era ser pai.

Na última sexta, Guilherme mandou uma mensagem para a mulher contando que estava saindo do trabalho. Ela acordou no meio da noite e percebeu que o marido não havia chegado. Os irmãos saíram para procurá-lo, e encontraram o corpo ainda estirado na rua.

Segundo Emanuelle, policiais que resguardavam a cena do crime debocharam da família várias vezes. Na delegacia e no Instituto Médico-Legal (IML), onde liberaram o corpo, os parentes voltaram a ser hostilizados.

— Dificultaram o reconhecimento, tacharam meu irmão de bandido… Isso tudo acabou trazendo ainda mais sofrimento. Só começaram a aceitar que ele era inocente quando a gente conseguiu levar a testemunha para dar o depoimento, e perceberam que ele estava trabalhando até pouco tempo atrás — afirma.

Fabio Almeida é lotado na 2ª Companhia do 12º Batalhão de Polícia Militar Metropolitano, com sede na Vila Mariana, na capital. No registro de ocorrência, o PM disse à polícia que voltava para casa quando foi abordado por homens em cinco motos que se aproximaram e tentaram roubá-lo. Ao reagir, efetuou disparos.

Os criminosos fugiram, mas uma das motocicletas ficou no local. Almeida decidiu, então, permanecer no mesmo ponto. Ao perceber o retorno dos indivíduos a pé, teria disparado contra eles. Um dos tiros acertou Ferreira na cabeça.

Uma das testemunhas ouvidas pela polícia, que trabalha com Guilherme, confirmou que ele havia acabado de sair da marcenaria, após bater o ponto às 22h28m. Segundo o colega, ele estava acompanhado de outros funcionários e correu em direção ao ponto para não perder o ônibus. A vítima não sabia sequer pilotar motos.

Outro funcionário da mesma empresa, que também saía do trabalho com o grupo, chegou a ser preso acusado de envolvimento com o roubo ao policial militar. Ele foi liberado após prestar depoimento.

O Instituto Sou da Paz divulgou uma nota na qual afirma que a morte de Guilherme “não é caso isolado, mas reflexo do racismo estrutural e de modelo policial que prioriza ostensividade”. A organização cobrou que o governo de São Paulo “se posicione publicamente condenando a atuação policial marcada por um viés racial tão nítido e tão pouco profissional”.

“Essa situação é inadmissível, pois os protocolos policiais são claros ao permitirem o uso da força letal pela tropa apenas em última instância, quando todas as outras possibilidades já foram exauridas e quando há vidas evidentemente em risco, o que claramente não foi o caso”, acrescentou o instituto.



Conteúdo Original

2025-07-08 03:30:00

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