Nos meus tempos de repórter numa grande editora, eu costumava acompanhar reuniões com leitores da revista em que trabalhava. Naquela roda de conversa, um grupo formado por dezenas de assinantes discutiam matérias que haviam sido publicadas, apontavam quais assuntos queriam que fossem abordados, mas, quando questionadas sobre quais reportagens mais gostaram, frequentemente, essas pessoas citavam textos que diferiam totalmente dos temas que elas tinham afirmado que eram do seu interesse. A conclusão após essas reuniões de leitores, na imensa maioria das vezes, era a mesma: o público deseja consumir o que ele ainda não tem consciência que quer.
Trabalhando com audiovisual há mais de dez anos, tenho a certeza que essa lógica também se aplica à produção de filmes e séries. Por mais que o algoritmo das plataformas consiga analisar os dados de consumo dos usuários para definir o tipo de conteúdo que os espectadores gostam, essa tecnologia não tem a capacidade de prever os desejos do inconsciente coletivo. Se fôssemos levar em consideração apenas o que é apontado pelo algoritmo, é pouco provável que “Round 6”, da Netflix, tivesse sido produzida. Afinal, uma série dramática pautada por violência e por uma forte crítica social não era o tipo de conteúdo que fazia sucesso no streaming até então.
2025-07-02 05:30:00